O PIM tem custo ZERO para o Brasil

Thomaz Nogueira
8 min readDec 6, 2018

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Sabe aquela estória que para toda questão complexa tem uma resposta simples e … ERRADA? Assim é a discussão sobre o futuro do Polo Industrial de Manaus (PIM) . É complexa, sem respostas simples que sejam corretas. Dito isso, você tem paciência? Queria expor alguns pontos que ajudam na percepção do tema.

Linha de produção da Moto Honda, uma das maiores Indústrias do PIM.

As reuniões iniciais com a equipe econômica do presidente eleito geraram um sentimento de apreensão entre agentes econômicos e políticos representantes do Amazonas e do PIM. “Até ai, morreu o Neves”. Não há uma proposta específica ainda, apenas a confirmação dos posicionamentos conceituais próprios de uma visão ultraliberal, coerente com o que foi defendido na campanha e previamente expostos neste espaço.

De concreto apenas a tensão entre dois setores do novo governo. Os militares da equipe de governo tem uma visão distinta sobre o tema Zona Franca de Manaus e o PIM em relação a visão da equipe de Paulo Guedes, o superministro da Economia.

Nesse quadro, alguns atores locais, pouco afeitos ao processo de discussão que normalmente se trava com Brasília e com os demais Estados e agentes econômicos, decidiram pontificar sobre o tema.

Vimos as mais variadas “boutades”. Desde o “já vai tarde, PIM”, até a mais convicta manifestação de que não há riscos. Devagar, ladies and gentlemen, nem tanto a terra, nem tanto ao mar.

A melhor forma de endereçar corretamente a solução de um problema é defini-lo de forma eficaz. As manifestações passaram longe disso. As sugestões ou repetem o wishful thinking do processo eleitoral ou carecem de contato com a realidade.

Trago alguns pontos para a reflexão, não sem antes fazer um lembrete e uma ligeira digressão.

Uma ponte para o futuro

Ah, não mudei de opinião, mas a escolha democrática foi feita. Quando há tantas coisas socialmente importantes em jogo não cabe — nem por um segundo — olhar pra trás e falar: "Não disse?". O importante agora é focarmos em uma articulação capaz de mostrar o que é vital para o País e para o Amazonas: Fortalecer o PIM.

Eu falei o PIM, a Zona Franca inclui ainda o comércio e o “agropecuário” que devemos analisar em separado.

A digressão diz respeito à necessidade de construirmos um consenso entre nós da validade do PIM, como instrumento eficaz de desenvolvimento. Entendermos seu significado presente e futuro. Minha experiência diz que o Polo Industrial é sim a sustentação da nossa economia no presente, e ainda será no futuro imediato. Explico.

Toda a economia amazonense gira a partir da atividade industrial. Comércio e Serviços são função matemática do nível dessa atividade industrial. Portanto, não existem de forma autônoma, como em outras economias. Na verdade, o PIM não é apenas o que garante hoje atividade econômica e renda nos mais variados setores (Uma vez mais: Comerciantes, médicos, faxineiros, professores universitários, advogados, vendedores de seguro, gerente ou garçom de restaurante, bancário e toda sorte de profissionais e empresas, mesmo que não prestem serviços diretamente, dependem dele, ainda que não acreditem), mas, como naqueles comerciais de TV, não é só isso, é mais importante ainda. É o passe para o futuro de uma economia mais diversificada, a partir da construção de um outro pilar: A Bioeconomia Amazônica.

Sem essa ponte, qualquer transição será extremamente dolorosa e provavelmente muito danosa socialmente e catastrófica ambientalmente. Porto de lenha é pouco.

Há tempos que defendemos esse processo de imediata diversificação da economia amazonense. Algumas coisas tenho obrigação de saber, que passa longe do dia-a-dia dos demais cidadãos. Como ex-Secretário Executivo da Receita da SEFAZ-AM sei que 50% da arrecadação estadual se origina em menos de 20 empresas, sendo que pelo menos 17 dessas são do PIM. Essa brutal concentração e dependência tem de mudar sim, e o nome do jogo é DIVERSIFICAÇÃO.

Com esse diagnóstico construído, quando alguns ainda defendiam que fora do PIM não havia Amazonas, trabalhamos duro com uma serie de profissionais extremamente qualificados, para propor um Mapa do Caminho do Processo de Diversificação. Ali, abordamos de forma crítica o modelo Zona Franca de Manaus e os caminhos do futuro.

A síntese é que, para evoluir, nossa economia precisa de 2 VETORES: O PIM e a BIOECONOMIA (Aquicultura, Piscicultura, Fruticultura, Biocosméticos, Biofármacos, Produção Florestal sustentável — madeireira e não-madeireira, Turismo, etc.), além de fortalecimento de elementos de suporte como Energia, Logística, Tecnologia da Informação e infraestrutura de Comunicação. Sem, claro, fugir do debate sobre a Questão Mineral.

Assim, é de ingenuidade atroz falar que o PIM deve morrer ou já era. Repetindo: Ele é a necessária ponte para um futuro mais diversificado. Daí virão os recursos necessários para essa evolução. Essa transição não vai ocorrer da noite para o dia e ao fim não se deve prescindir da expansão do PIM, quando de consolidação desse processo de diversificação.

Se não construirmos tal consenso, estaremos defendendo algo que não acreditamos, o que nunca funciona.

Seria pura estultice abrir mão de um modelo gerador de emprego, i.e, massa salarial, responsável por cerca 50% do tributos federais da Região Norte, que economiza divisas para o país, que trouxe conhecimento e domínio de tecnologia de produtos e de produção, além de fornecer capital para a busca da inovação e outras tecnologias. Ah, e que é um fator indiscutível de preservação ambiental, ao oferecer alternativa formal de emprego.

Portanto, além dessas externalidades positivas, há o aspecto da criticidade financeira. Sem o PIM, um buraco se abre no orçamento do Estado e da União. Todo investimento e gasto público e uma série de contrapartidas, como recursos para Pesquisa, Desenvolvimento, Inovação e Empreendedorismo (P,D,I&E) e o próprio financiamento da UEA (Universidade do Estado do Amazonas) passam por aí. Não se trata apenas de salário e custeio, mas também são os recursos das ações de inovação e diversificação.

Nessa minha opinião, estou em boa companhia. Aos pitaqueiros de plantão, penso que nunca é demais lembrar a avaliação feita pelo Prof. Norbert Fenzl, no trabalho organizado pelos Professores Alexandre Rivas e José Alberto Costa Machado, do Instituto Piatam, intitulado “INSTRUMENTOS ECONÔMICOS PARA A PROTEÇÃO DA AMAZÔNIA: A EXPERIÊNCIA DO POLO INDUSTRIAL DE MANAUS.

Todos os dados apresentados indicam que a verdadeira função do PIM é a de um catalisador econômico que de um lado alivia a pressão sobre a floresta amazônica e por outro lado é capaz de canalizar recursos financeiros para a educação e desenvolvimento de CT&I que por sua vez impulsionam o desenvolvimento de tecnologias e inovações de processos econômicos sustentáveis ao longo prazo”

Norbert Fenzl, Ph.D,

CORDIS — Community Research & Development Information Service. Bruxelas -Bélgica

Custo Zero

Portanto, agora sim, revenons à nos moutons, ou seja, voltemos à vaca fria que é como conduzir com Brasília essa discussão de validade e eficácia do PIM. À guisa de contribuição faço minhas observações, que espero ajudem os que estão empenhados na defesa de nossa economia.

É imprescindível que tenhamos a competência para mostrar a validade desse modelo. Não é favor. Não basta repetir que temos a proteção constitucional. Sim, se necessário devemos ir ao STF. Mas antes é preciso enfrentar a desinformação e a má-vontade daí resultante.

Primeiro precisamos entender quem são os interlocutores. O que pensam? O que pretendem? Os economistas de viés ultraliberal, como é o caso presente, tem um mantra imanente: “Se você não tem competitividade para produzir sem quaisquer proteções, procure outra coisa para fazer.” Parece sensato, mas a vida real é mais complexa.

Em diversos momentos, diversas sociedades buscaram alternativa ao que parecia ser uma sentença de estagnação econômica, quebraram essa a regra do jogo liberal, introduzindo mecanismos de indução à atividade econômica. Sim, porque a obediência ao mantra significaria apenas perpetuar a situação histórica de concentração. Não foi diferente aqui.

Foi para responder à estagnação pós-boom da borracha e a propostas estapafúrdias, como a da criação dos lagos artificiais e consequente internacionalização da Amazônia, formulada por Herman Khan do Instituto Hudson, que se desenhou a Zona Franca de Manaus.

Ok, diriam alguns, a ZFM teve seu momento histórico, mas agora é um peso para o Estado Brasileiro, um custo altíssimo de Renúncia Fiscal e alto impacto na Balança Comercial. Não, não é.

É preciso desmistificar essas questões e demonstrar de forma categórica:

O Custo do Polo Industrial de Manaus é ZERO para o Orçamento da União e, portanto, para a sociedade brasileira.

É preciso entender alguns aos mecanismos de funcionamento do modelo.

  1. No modelo do PIM quem TOMA O RISCO É O EMPREENDEDOR, SE ELE QUEBRAR O PREJUÍZO É DELE, não do Estado Brasileiro. Os benefícios para a produção em Manaus são de natureza tributária, ou seja, até colocar seu produto na prateleira TODO O RISCO é do empreendedor. Essa principal característica é que definiu inicialmente como principais empresas do Polo Industrial, as grandes empresas multinacionais naturalmente capitalizadas ou joint-ventures com empreendedores nacionais igualmente capitalizados (gostemos ou não). Todo custo de implantação do processo de produção é arcado pelo empreendedor. Se não tiver sucesso no mercado, só ele responde pelo fracasso.
  2. Não há Financiamento Público como componente do modelo. Eventual acesso a financiamento é igual a qualquer outra empresa no território nacional, nenhuma forma, nenhum benefício específico da Zona Franca de Manaus.
  3. O Custo para o Orçamento Público é ZERO. Lastreado no PIM, o Amazonas é superavitário em suas relações com a União, ou seja, recolhe mais tributos que recebe de repasses mandatórios. Republico o quadro a seguir para que possamos ter esses números na massa do sangue na hora de discutir. Uma debacle do PIM, abriria um rombo MONUMENTAL no Orçamento Federal e outro maior no do Estado.
  1. Nem mesmo a manutenção da máquina administrativa de Gestão e Controle custa algo ao Governo Federal. Do total que a Suframa arrecada fica com aproximadamente 40%, o restante vai ajudar no resultado primário. Em 2014, meu último ano como superintendente, arrecadamos algo em torno de R$ 500 milhões e Brasília se apropriou, via contingenciamento, de R$ 300 milhões.
  2. Não há que se falar em RENÚNCIA FISCAL (o chamado Gasto Tributário). Repito o que já afirmei, o que aqui produzimos (com raríssimas exceções) não seria produzido no país sem benefícios de alguma ordem. Nosso competidor é a Ásia, especialmente a China. E o que aqui produzimos NÃO É PRODUZIDO nas economias ocidentais, se não for em um quadro de tributação diferenciada.
  3. A exploração do argumento de Balança Comercial deficitária do PIM é uma falácia. Importamos insumos industriais. O valor é significativo, porque significativo é o volume de produção. Se não produzíssemos aqui gastaríamos mais em importações de produtos finais. Só um cego não vê. Podemos e devemos atingir outros mercados, falo disso no próximo artigo, mas independente disso, esse argumento contra é torto.

Enfim, o PIM é relevante porque é o motor da vida social e econômica do Amazonas. Saúde, Educação, Pesquisa, Proteção Ambiental, todas as grandes e pequenas coisas ainda dependem do seu sucesso e mesmo numa transição para uma economia diversificada ainda haverá um papel importante, indispensável, diria, nos próximos 20 anos. Precisamos de articulação e de objetividade na discussão. Se vencermos essa etapa podemos efetivamente avançar para algumas medidas corretivas e outras evolutivas.

P.S — Tenho dito que nosso esforço tem sido em defender o modelo, quando deveríamos estar discutindo sua evolução. Tem coisas simples e complexas. Incluir o Aeroporto Eduardo Gomes no processo de privatização é mais simples e muito eficaz para o Turismo, mas trato disso no próximo artigo.

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Thomaz Nogueira
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Written by Thomaz Nogueira

Especialista em direito tributário, já foi Secretário Executivo da Receita na SEFAZ-AM, Superintendente da Suframa e Secretário de Planejamento do AM.

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